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Caderno D

João Falcão mantém atualizada a peça de Chico Buarque 'Ópera do Malandro'

11 março 2015 - 08h00

O diretor João Falcão é um artista inquieto - além de ser um apaixonado por temas que envolvam o homem comum e a transcendência pela paixão, ele não se contenta com o material que tem à disposição e parte em busca de complementos que enriquecem o produto final. É o caso de Ópera do Malandro, clássico musical de Chico Buarque, que estreia para convidados na próxima sexta-feira, no Theatro Net SP. As sessões para o público começam no dia seguinte, quando também volta em cartaz “Gonzagão - A Lenda”, que vai ocupar as matinês do mesmo teatro aos sábados e domingos. Na montagem, Falcão deu mais forças e complexidades para personagens originalmente secundários, como Barrabás, empregado do malandro que depois muda de lado. O encenador também manteve quase todas as músicas do espetáculo original, montado pela primeira vez em 1978, e ainda acrescentou músicas do disco Malandro, que Chico lançou em 1985, e também da versão para o cinema dirigida por Ruy Guerra, naquele mesmo ano. Para isso, fez pequenas cirurgias no texto original, invertendo algumas cenas e excluindo outras. "Nem o próprio Chico notou a diferença", diverte-se Falcão. "Havia canções do disco e do filme que ele achava pertencer ao espetáculo original." O motivo é que muitas músicas, como Teresinha, O Meu Amor e Pedaço de Mim, ganharam vida própria na interpretação de cantores profissionais. "Apenas deixei de fora Hino da Repressão, Desafio do Malandro e Rio 42 porque não se encaixavam, apesar de belas", explica o diretor. A peça conta a história do casal Fernandes de Duran e Vitória Régia, proprietários de um bordel da Lapa carioca, frequentado por bandidos e policiais e onde a relação entre a lei e o crime é promíscua. Duran e Vitória são os pais de Teresinha, menina delicada que foi enviada para o exterior para que crescesse longe da bandidagem. Ao voltar, porém, Teresinha casa-se com o malandro Max Overseas, sob as bênçãos do inspetor Chaves, o Tigrão. E a mocinha acaba por revelar um inesperado talento para o submundo ao assumir o controle do contrabando. Outros personagens memoráveis são Lúcia, rival de Teresinha, e o travesti Geni, apaixonado pelo delegado da cidade. "A peça se passa no Rio de Janeiro de 1940, mas seus temas principais ainda são muito atuais", observa Falcão. "Afinal, é ambientada no mundo do crime e do contrabando e mostra como o poder pode modificar o comportamento das pessoas, mesmo das mais idôneas." Chico inspirou-se na Ópera dos Três Vinténs, escrita em 1928 por Bertolt Brecht e Kurt Weil, que, por sua vez, se inspiraram na Ópera dos Mendigos, de John Gay, lançada em 1728. "Brecht e Chico falam da ambição movida pelo dinheiro, que se transforma em um meio de opressão e provoca a mercantilização dos corpos e a manipulação do povo", comenta o diretor. "E o texto do Chico continua atual pois reflete sobre o contexto social e econômico do Brasil dos anos 1970, quando ele escreveu o musical, e do século 21. Basta ver o segundo ato da peça, marcado por manifestações populares, uma insatisfação geral sobre o rumo da situação." Falcão acrescentou ainda outra novidade à sua montagem, essa talvez mais polêmica: todos os personagens, especialmente os femininos, são interpretados por homens - a única exceção é Larissa Luz, que faz João Alegre, o narrador, nome que evoca John Gay. Na verdade, foi um acaso que permitiu tamanha experimentação - depois de dirigir Gonzagão - A Lenda (leia mais abaixo), Falcão queria manter unido aquele grupo de atores que tão bem se entrosara e participara de um espetáculo memorável. "Eram oito homens e apenas uma mulher, na época, Laila Garin, que depois faria Elis - O Musical", conta Andréa Alves, diretora da Sarau, produtora responsável pelos trabalhos dirigidos por Falcão. "João preferiu então manter o grupo, alternando papéis masculinos e femininos entre todos os homens e criando assim um tom brechtiano no espetáculo."

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