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Jornal Diário de Suzano - 21/12/2024
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Coluna

Aprender com os índios

28 janeiro 2021 - 05h00
Li recentemente um artigo chamado Sair para o mato: estratégia Yanomami contra a COVID-19 de Thiago Benucci e Daniel Jabra, estudantes de mestrado em antropologia, sobre a mobilidade dos Yanomami do Rio Marauiá (Amazonas) como estratégia de sobrevivência diante da expansão da Covid-19. Estratégia de mobilidade é fugir para o mato e evitar a propagação do contágio. 
A comunidade torra farinha, reabre antigos caminhos em meio a mata e se dispersa. A última vez que usaram essa estratégia foi em 2001 quando suas roças pegaram fogo e findaram-se os alimentos cultivados.
Essa forma de mobilidade é usada pelos Yanomami tanto em tempos de fartura quando saem em busca de frutos na floresta quanto em tempos de fragilidade e ameaças advindas tanto de eventuais desavenças internas quanto do perigo iminente exterior como uma aldeia adversária e o homem branco.
As epidemias também não são novas para esse povo. Os Yanomami já enfrentaram a coqueluche, o sarampo, a tuberculose e tantas outras epidemias que na maior parte das vezes foi consequência do contato com o homem branco: missionário, representante do Estado, garimpeiro.
Curiosamente, os Yanomami estão repetindo a mesma estratégia de isolamento social tantas vezes recomendada pelos seus anciãos e pajés para evitar as doenças levadas pelo homem branco; e os homens brancos, desta vez, perdidos diante de um vírus desconhecido, tornam-se vulneráveis como os Yanomami tantas vezes o foram diante das epidemias propagadas pelo próprio homem branco em seus territórios.
São os mesmos Yanomami que usam raspas de casca da envira-preta para combater a malária no lugar da cloroquina e sabem que o remédio natural não serve para enfrentar a Covid-19 e que produziram um livro chamado Manual dos Remédios Tradicionais Yanomami. Esses índios com tanto conhecimento organizado, sistematizado são ressabiados com o "povo da mercadoria", como nos rotulou Davi Kopenawa, pajé que recentemente escreveu com Bruce Albert o livro A Queda do céu: palavras de um xamã Yanomami.
Aliás, como ensina o antropólogo Bruce Albert em outro texto chamado Agora somos todos índios: "o destino trágico que reservamos aos Yanomami - a todos os povos indígenas - terá sido apenas uma prefiguração do que estamos hoje nos infligindo a nós mesmos, desta vez, em escala planetária".
Talvez seja o momento de refletirmos sobre a diversidade de culturas, sobre o potencial de aprendizado com os muitos povos da Terra, sobre uma nova relação com a biodiversidade planetária, e aprendermos com os índios.