Nesses últimos dias ganhou destaque na imprensa e força no debate público a apresentação de um documento feito pela deputada federal Erika Hilton (PSOL) que busca reduzir a jornada de trabalho no País sem corte salarial. Esse documento se conseguir assinaturas de pelo menos 171 dos 513 deputados pode tornar-se Projeto de Lei.
No Brasil a jornada de trabalho é regulada pela Constituição Federal de 1988 (CF-88) e pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A CF-88 estabelece em seu artigo 7º "os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social" e define nos incisos XIII e XV a jornada semanal de trabalho e o repouso semanal:
" No inciso XIII, a jornada de trabalho semanal - "duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho";
" No inciso XV, o repouso semanal - "repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos".
A partir desses dois incisos fica convencionada uma escala de trabalho de 6×1, ou seja, 6 dias de trabalho e um dia de descanso com total de no máximo 44 horas de trabalho por semana.
O Projeto de Lei (que ainda é um texto inicial não formalizado) da deputada federal Erika Hilton (PSOL) propõe que o inciso XIII do artigo 7º da CF-88 passe a vigorar com a seguinte redação:
" "duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e trinta e seis horas semanais, com jornada de trabalho de quatro dias por semana, facultada a compensação de horários e a redução de jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho".
A deputada argumenta que esta medida "alinha-se aos princípios de justiça social e desenvolvimento sustentável, buscando um equilíbrio entre as necessidades econômicas das empresas e o direito dos trabalhadores a uma vida digna e a condições de trabalho que favoreçam sua saúde e bem-estar". Considera-se ainda o aumento de produtividade, segundo estudos da 4 Day Week Global.
Não se trata de medida nova e tampouco de novos argumentos.
Em 1995, o deputado federal Eduardo Jorge, atualmente filiado ao Partido Verde (PV), apresentou o Projeto de Lei 271 amplamente discutido até seu arquivamento em 1999. O mesmo debate foi retomado em 2001 e rearquivado em 2023.
A proposta inicial propunha alterar a redação do art. 7º, inciso XIII, da CF-88, para reduzir a jornada de trabalho de 44 para 30 à razão de uma hora por ano, facultada a ampliação da jornada até o limite de 8 horas diárias e 40 horas semanais, mediante acordo a critério dos empregados e empregadores.
Os argumentos históricos evidenciando o aumento de produtividade com a redução da jornada de trabalho remontam a Henry Ford que implementou a jornada de trabalho de cinco dias por semana em suas indústrias. Para o industrial, em 1926, já era "hora de nos livrarmos da noção de que o lazer para os trabalhadores é 'perda de tempo' ou privilégio de classe".
Outro industrial que adotou a medida em 1930 foi W. K. Kellogg que declarou tempos depois: "o custo de produção por unidade baixou tanto que podemos pagar por seis horas diárias o mesmo que pagávamos antes por oito".
O debate proposto por Erika Hilton (PSOL) é antigo e nos traz à tona a proposição de Eduardo Jorge que merece ser reconsiderada sem maiores exigências de coleta de assinaturas. Com diferentes tipos de argumento, em países e períodos muito distintos, esse debate une empresários como Henry Ford e W. L. Kellogg à deputados Erika Hilton e ao ex-deputado Eduardo Jorge.
Eduardo de Lima Caldas foi candidato a prefeito em Suzano em 2004. É professor de Gestão de Políticas Públicas na USP.